
Iniciada em 7 de agosto, a greve de escrivães, papiloscopistas e agentes federais vai entrar para a história do País como a mais longa já promovida pela categoria e a primeira greve na era das redes sociais. De norte a sul do Brasil, milhares de policiais estão mobilizados e mostrando à sociedade, por meio de seus atos públicos, a indignação de um grupo de servidores que goza do respeito da população brasileira.
Em Foz do Iguaçu não é diferente. Por lá os colegas se mobilizaram desde os primeiros dias da greve e não teve cara feia de delegado nem corte de ponto que fizesse os federais retrocederem em sua luta. Até aí nenhum novidade. Mas à frente da greve dos policiais federais em Foz do Iguaçu está uma agente federal.
Bibiana Orsi é representante do Sindicato dos Policiais Federais no Paraná em Foz e esteve ao lado dos colegas em todos os momentos da greve. Há cinco anos lotada em Foz, Bibiana foi advogada e professora universitária de Direito Penal e Administrativo. Ao longo dos últimos anos, atuou em diversos setores da descentralizada e aprendeu desde cedo que a imagem reproduzida pela mídia sobre a PF não corresponde à realidade da maioria dos policiais. “Na fronteira, cada dia é uma luta”, diz a agente.
Bibiana é uma mulher à frente de um movimento que é de todos os policiais federais. Para ela, o papel da mulher na greve é só mais um tipo de luta no caminho das policiais. “Mulher é assim. É mais difícil fugir da luta quando se pensa em filhos, maridos e famílias que dependem de nós. Fazer greve para mulher é fácil, difícil é se tornar policial, é sobreviver na PF”. Diz.
Em entrevista à Agência Fenapef, Bibiana fala da greve, das lições que este movimento deixa para todos e sobre a sua visão do futuro do Departamento de Polícia Federal.
Agência Fenapef - Qual a avaliação da greve na tríplice fronteira?
Bibiana Orsi - Tudo o que ocorre na fronteira tem um tempo diferente, e com a greve não poderia ser diferente. Quem trabalha em Foz e em outras lotações iguais a esta rala muito e aprende que cada ganho vem na base da luta. Aqui longe das estruturas das superintendências nos tornamos sobreviventes e é por isto que os colegas lutam tanto para mudar a polícia que temos hoje.
Agência Fenapef – Você assumiu a representação do sindicato em Foz do Iguaçu. Quais os principais desafios do sindicato nesta região?
Bibiana Orsi - Estou no segundo mandato da Delegacia Sindical em Foz, e meu desafio é construir uma unidade melhor do que encontrei cinco anos atrás ao chegar aqui. Para o DPF somos matrículas que devem produzir estatísticas que promovem carreiras dentro do DPF. Assumi o SINPEF.PR em Foz porque me preocupo com os homens e mulheres, com as famílias por trás das matrículas. O que tem para ser feito em Foz? Tudo, como em toda a fronteira.
Agência Fenapef - Quais os principais fatos que marcaram a greve em Foz do Iguaçu?
Bibiana Orsi - O movimento tem muitas caras. Começou com nossas enormes operações-padrão na Ponte da Amizade, depois na Ponte da Argentina e no Aeroporto das Cataratas. Foi lindo ver o empenho dos colegas ralando sob o Sol. Veio a decisão do STJ e nasceu a “SEM-PADRÃO”, foi natural, consensual a criação do ato de nos amarrarmos na Ponte com as mãos para trás e então o movimento se reinventou. A imagem falou mais do que qualquer palavra. Partimos para atos como a “invasão” das cataratas, pois entendemos que se as cataratas são patrimônio da humanidade a PF é patrimônio do Brasil. Fizemos passeata pela BR-277 junto com os colegas guerreiros de Cascavel. Daqui para frente só a base poderá determinar o que ocorrerá. O que me marca, de verdade, são os rostos, os olhos dos colegas cheios de esperança todos os dias na barraca da greve. O movimento cresce porque se alimenta de sonho e de verdade.
Agência Fenapef – Como você avalia a participação das mulheres na greve dos EPA´s?
Bibiana Orsi - As guerreiras grevistas ocupam seu espaço, lutam, gritam, seguram faixas. Mulher é assim. É mais difícil fugir da luta quando se sente o movimento, quando se pensa em filhos, maridos e famílias que dependem de nós. Fazer greve pra mulher é fácil, difícil é se tornar policial, é sobreviver no DPF. Greve é só mais um tipo de luta no nosso caminho. A Polícia Federal possui uma política sexista que começa com os editais de concurso e se estende por toda a carreira, enquanto polícias na Europa desenvolvem programas para atrair mulheres para as corporações o DPF nos quer fora.
Recentemente foi realizada licitação para aquisição de coletes balísticos, foi inacreditável saber que não foi comprado sequer um colete feminino como se não fossemos policiais ou como se devêssemos deixar de ser mulheres. Faltam alojamentos femininos, há discriminação para participação de cursos e missões e é claro, não existe no DPF o princípio da isonomia, já que e aposentadoria da mulher garantida constitucionalmente é apenas um sonho. Enfim, a greve é mais uma das lutas a serem enfrentadas pelas policiais federais.
Agência Fenapef – Qual o saldo que esta greve deixará para os policiais?
Bibiana Orsi - Esta greve por si só já operou uma verdadeira reestruturação da PF, pois os colegas foram modificados. Quebraram-se os grilhões de submissão, de falsa hierarquia e disciplina, que na verdade sempre significaram subserviência. Hoje temos colegas conscientes de seu valor e de NOSSO potencial. A greve de hoje é fruto das greves de 94 e 2004, do amadurecimento proporcionado pelas lutas da FENAPEF e pela oxigenação causada pelo concurso de 2004. No meu entendimento nós já somos vencedores pois nada mais será como “antigamente”. De agora em diante se apresenta um novo caminho, que nos levará à Polícia que a sociedade brasileira espera que nos tornemos.
Agência Fenapef – Como você analisa o papel das redes sociais na greve da PF?
Bibiana Orsi - É simples, as redes sociais não têm preço. O resto sim.
Agência Fenapef – Como você analisa as relações internas dentro do DPF?
Bibiana Orsi - Relações? Bom qualquer interação mesmo que prejudicial deve ser entendida como relação. Os dogmas do DPF estão errados. A verdade essencial, na verdade é uma mentira. Polícia existe pra proteger o cidadão, pra prender bandido e nenhum destes resultados é alcançado pelo IPL. Sinceramente não entendo como pessoas que possuem formação semelhante à minha, bacharelado em direito, se prendem a um instrumento que se distancia tanto do que deva ser a justiça. Relação interna mesmo, só entre EPAs, os futuros OPFs, o resto ou é exceção ou obrigação.
Agência Fenapef – Qual o sentimento dos policiais federais em relação ao seu papel funcional no DPF?
Bibiana Orsi - Imagine um cavalo puro sangue lindo, perfeita formação, potencial para ser um campeão nas pistas; pegue este cavalo e amarre em uma carroça. Hoje todo potencial de agentes, escrivães e papiloscopistas federais é desperdiçado em atividades elementares. Quando realizamos grandes investigações, operações e prisões somos premiados com o anonimato. O policial quer produzir, quer investigar, quer crescer, quer mudar o modelo de segurança estabelecido, quer assumir o papel de “agente” da segurança e ser “escrivão” de uma nova história para a Polícia Federal.
Agência Fenapef – Como você ingressou no sindicalismo quais as dificuldades de uma mulher à frente do movimento sindical?
Bibiana Orsi - Ingressei no sindicalismo por ser uma indignada, assim como entrei no Departamento por este motivo. Sou o tipo de pessoa que queima de raiva ao ver algum colega ser prejudicado e me preocupo se ao fim do dia todos os meus “meninos” (EPAS) voltarão pra casa.
Estou no sindicato porque acredito que só nossas entidades de classe podem construir um panorama diferente, pergunto quando alguém tem dúvidas quanto a se sindicalizar: “vc acha que a polícia estaria melhor ou pior sem nossos sindicatos” e a resposta é sempre mais um sindicalizado.
Agência Fenapef – Alguns colegas infelizmente não aderiam ao movimento. Como você avalia essa questão?
Bibiana Orsi - Avalio como uma questão de tempo, mesmo aquele que dorme um pouco mais, uma hora acaba por despertar.
Fonte: Agência Fenapef