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Hierarquia funcional ou diferença Postado em 10/09/2012 por SINPEFRN às 00:00

Paul Joseph Goebbels foi personagem emblemático do regime nazista da Segunda Guerra Mundial. No cargo de ministro das Comunicações, ajudou a exortar os alemães a aceitarem os delírios e insanidades de Adolf Hitler. Suicidou-se um dia depois de seu líder, ao final da guerra, não sem antes assassinar primeiro seus seis filhos pequenos e sua esposa. Foi Goebbels o primeiro alemão a utilizar a saudação nazista “Heil Hitler” (Salve Hitler). É dele também a famosa citação: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade.”

Há muito nos encontramos em um processo de luta por melhorias profissionais, que, infelizmente para nós e para a sociedade como um todo, nos empurrou para o atual estado de greve. Entretanto, este processo legítimo de busca por melhores condições profissionais para todos nós e para o bem-estar de nossas famílias, vem sofrendo fortíssima ação contrária por parte daqueles que, se quisessem, poderiam ser o “fiel da balança” a nosso favor.

O pior de tudo é que o principal argumento utilizado em oposição a nossos pleitos é fundamentado em uma mentira repetida mil vezes: a de que hierarquia é derivada da diferença salarial. Isto é embuste, falácia, engano, sofisma.

É um raciocínio vicioso concebido com a intenção de conduzir ao erro, sempre utilizado por aqueles que, sem argumentos funcionais que justifiquem uma desarrazoada diferença salarial entre os cargos da Polícia Federal, tentam e muitas vezes conseguem ludibriar os ingênuos com o argumento de que a similitude de vencimentos entre agentes, papiloscopistas, escrivães, delegados e peritos da Polícia Federal significaria uma ameaça à hierarquia e à disciplina, pilares de nossa instituição. Engodo. Falácia. Mentira.

Parte considerável dos atuais dirigentes do DPF viveu a realidade em que agentes, escrivães e papiloscopistas da classe especial percebiam vencimentos superiores aos de delegados e peritos recém ingressados na primeira classe. Portanto, hierarquia, disciplina e respeito não são corolários de diferenças salariais.

Se assim o fosse, personagens-chaves da administração pública brasileira estariam agindo a seu bel-prazer, movidos exclusivamente por suas vontades, sem observar o direcionamento governamental dado pela gestora maior de nosso Poder Executivo, a presidenta Dilma Vana Rousseff.

Os ministros Miriam Aparecida Belchior, Guido Mantega, Celso Luiz Nunes Amorim Paulo Bernardo Silva, Fernando Damata Pimentel, assim como centenas de servidores públicos federais recebem vencimentos maiores do que o vencimento auferido pela presidenta. Nem por isso lhe dirigem menos respeito ou consideração ou deixam de cumprir suas obrigações. Nem por isso insubordinam-se ou  transgridem a disciplina que, em razão de seus cargos, devem observar.

Se hierarquia, disciplina e respeito fossem corolários de diferenças salariais, delegados e peritos federais não viveriam em convivência pacífica. Como também, agentes, papiloscopistas e escrivães federais, seguindo essa lógica, desrespeitar-se-iam mutuamente. Da mesma forma, qualquer relação funcional na qual a subordinação não fosse derivada de uma diferença salarial estaria ameaçada pelo emparelhamento de vencimentos, como se a simples circunstância de receber mais do que o outro conferisse autoridade a alguém.

A tão difundida “trava salarial” entre cargos do Departamento de Polícia Federal inexiste de fato. Remanesce, entretanto, no imaginário daqueles que, temerosos de não se firmarem por sua competência, precisam elaborar raciocínios falaciosos como este para defender prerrogativas que acreditam estar ameaçadas por uma aproximação de vencimentos.

Essas mesmas pessoas tentam diminuir a importância dos cargos de agentes, escrivães e papiloscopistas, atribuindo-lhes como uma de suas competências “dirigir viaturas”, procurando aproximar as atribuições desses cargos com a função de motorista, como se esta atividade fosse menos nobre, ou como se dirigir viaturas não fosse uma atividade inerente ao ofício de um verdadeiro policial.

Todos sabemos que não há Polícia Federal sem o trabalho de agentes, escrivães e papiloscopistas, que não existem grandes operações sem o esforço hercúleo desses abnegados policiais, que se esmeram durante meses ou anos em uma investigação. Todos conhecemos a complexidade da atividade cartorária. Também sabemos que o quadro de professores da Academia Nacional de Polícia e dos inúmeros cursos de aperfeiçoamento existentes é composto por todos os cargos.

Na Coordenação de Aviação Operacional, outro exemplo, existem delegados que exercem a atividade de pilotos, como policiais federais de outro cargo, sendo, inclusive, subordinados àqueles que, quando em voo, exercem a função de comando. Isto ameaça a hierarquia?

Portanto, afirmar sua condição profissional a partir da diminuição do valor dos outros cargos é ser covarde, mesquinho e destituído de grandeza.

Hierarquia, disciplina e respeito não se compram, assim como dinheiro, riqueza e sucesso não são sinônimos de caráter, hombridade, honestidade ou honra. A importância de um cargo não se dá pelo cargo em si, mas pela pessoa que o ocupa.  A condição de delegado de polícia federal não confere maior valor que a condição de agente de polícia federal. A condição de perito criminal não confere maior valor que a condição de papiloscopista federal. A condição de juiz não confere maior valor que a condição de advogado.

É triste, mas a natureza humana é propensa a desvios. Insanidades, vaidades e ganâncias tomam o espírito daqueles que não tiveram a felicidade de uma criação fundamentada em princípios morais, éticos e religiosos suficientemente fortes para afastá-las. Por isso, o simples fato de ter dinheiro, de acumular riquezas não é atestado de idoneidade para ninguém.

Não há porque esmorecer em razão de uma falsa condição de inferioridade decorrente do cargo ocupado. É importante, no entanto, o discernimento e a sabedoria para reconhecer as diferenças e as obrigações decorrentes das relações de trabalho às quais todos nós estamos sujeitos, o que sempre o fizemos.

Estamos numa nova fase em nosso processo de luta por uma condição mais digna de trabalho, que corrija distorções decorrentes da falta de reconhecimento de nossas verdadeiras atribuições e de anos de distorção salarial. Precisamos, mais do nunca, mostrar nossa força e coesão, o que somente conseguiremos com o empenho ainda maior de todo nós, de nosso conjunto. Aos que estão empenhados nesta luta até o momento, parabéns. Apenas um tolo pode achar que alguém  possa estar satisfeito em participar de uma greve. Ao contrário, esta foi uma decisão a que fomos conduzidos pelas circunstâncias como um todo.  Significa sacrifício.

Àqueles que por alguma razão não se emparelharam em nossas fileiras desde o início, ainda há tempo e oportunidade de abraçar esta causa e todos que nelas estão empenhados. Com espírito aguerrido, continuaremos a lutar juntos, orar juntos, com a esperança de que um dia iremos conseguir fazer cair as máscaras daqueles que ora tentam, por medo, nos subjugar a uma ridícula condição de coadjuvantes em um orgão no qual, sem dúvidas, também somos protogonistas.

Não há investigações, nem inquéritos policiais, sem agentes, papiloscopistas e escrivães. Não existe Polícia Federal sem servidores de todos os cargos da carreira.

As sábias palavras escritas há séculos por Patrick Henry, um dos ícones da revolução americana, refletem de forma magistral este nosso momento e nossa batalha:

“É natural que o homem faça concessões às ilusões e à esperança. Estamos prontos a fechar os olhos diante de uma verdade dolorosa – e ouvir o canto das sereias, até que elas nos transformem em animais. Será este o papel dos homens esclarecidos, engajados na luta árdua pela liberdade? Estamos dispostos a cerrar fileiras com aqueles que, tendo olhos não vêm, tendo ouvidos não escutam as coisas que tocam tão de perto sua salvação secular? De minha parte, não importa a angústia que me custe ao espírito, quero conhecer toda a verdade; saber o pior para poder preveni-lo...

Não há mais lugar para a esperança. Se quisermos ser livres – se queremos preservar invioláveis privilégios por que vimos lutando há tanto tempo – se não queremos entregar a um abandono desprezível a nobre batalha em que há tanto tempo nos empenhamos e que juramos jamais abandonar até que o glorioso objeto da contenda nos pertença – devemos lutar! - repito, senhor, que devemos lutar! Pegar em armas, apelar ao Deus dos Exércitos é tudo que nos resta!”
 
Frederico dos Santos Araújo é agente de Polícia Federal, diretor jurídico do Sindicato dos Policiais Federais de Goiás. Este texto foi lido pelo presidente do Sinpef/GO, Adair Ferreira, durante solenidade cívica realizada pelos policiais federais em greve, em Goiânia, no dia 3 de setembro.

Fonte: Agência Fenapef

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