A nova estrutura da segurança pública do Brasil Postado em 19/03/2018 por Sindicato dos Policiais Federais às 14:05
Essa diferença entre competência para legislar e subordinar o desenvolvimento do serviço pode ser vista nitidamente quando se analisa a disciplina constitucional sobre a polícia civil, polícia militar e corpo de bombeiros militar do Distrito Federal. Apesar de também estarem subordinados ao governador do DF (art. 144, § 6º), a CF dispõe que compete à União organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio (art. 21, XIV).
O MESP possui competência constitucional para organizar e estruturar as polícias civis e militares do País, a partir de uma política integrada de segurança pública que contemple a prevenção e o controle da criminalidade, fenômenos que não respeitam fronteiras estaduais ou nacionais. Nesse regramento, o art. 144, §7º define que “a lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades”.
A exclusão da Polícia Ferroviária Federal
A estrutura organizacional do MESP foi transferida do Ministério da Justiça. Com isso, o novo ministério passou a conter o Departamento de Polícia Federal, o Departamento de Polícia Rodoviária Federal, o Departamento Penitenciário Nacional, o Conselho Nacional de Segurança Pública, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, a Secretaria Nacional de Segurança Pública e uma secretaria.
A Medida Provisória 821/2018, ao criar o MESP alterou a Lei nº 13.502/2017, que disciplina a estrutura dos ministérios do Governo Federal e revogou o art. 47, IV, que dispunha que a polícia ferroviária integrava a área de competência do Ministério da Justiça. Com isso a Polícia Ferroviária Federal (PFF) deixou de fazer parte da estrutura organizacional da União, mesmo estando contemplada na CF, dentre os órgãos de segurança pública do País.
Dispõe a CF no art. 21, “d”, que compete à União os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território. Diz ainda que a União tem a competência privativa de legislar sobre a competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais (art. 22, XXII).
Criada pelo constituinte originário para ser uma das polícias federais do Brasil, juntamente com a PF e a PRF, a PFF nunca foi efetivamente estruturada. A Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA) foi uma empresa estatal nacional de transporte ferroviário que cobria boa parte do território brasileiro, mas acabou sendo extinta em 1999, com a política de desestatização do governo federal, que promoveu a concessão dos serviços para a iniciativa privada.
O transporte ferroviário no Brasil possui uma rede de 30.129 quilômetros de extensão, espalhados por todo o País, possuindo ligações ferroviárias com Argentina, Bolívia e Uruguai. Além do transporte de passageiros, passa pelas ferrovias 25% de tudo o que é transportado no País, que representaram 464 milhões de toneladas de carga no ano de 2014, segundo os dados da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários.
O policiamento insuficiente da malha ferroviária do Brasil permite que uma infinidade de crimes, como contrabando, descaminho, tráfico de drogas e armas, sejam perpetrados pelos trilhos. O MESP precisa incluir a Polícia Ferroviária Federal na sua estrutura e disciplinar seu funcionamento, de forma a promover a segurança no transporte ferroviário nacional e cumprir o mandamento constitucional.
Desafios do novo Ministro do MESP
O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, tem conhecimento dos problemas dos órgãos policiais do País, desde que atuava como deputado federal e realizava audiências públicas com os órgãos de segurança e categorias policiais. Na época, já defendia a reformulação do modelo de policiamento, como a implantação do ciclo completo de polícia, e lidava com muitas resistências e corporativismos.
Vindo do Ministério da Defesa, responsável pela direção superior das Forças Armadas, constituídas pela Marinha, Exército e Aeronáutica, o ministro tem experiência na gestão de instituições de defesa da lei e da ordem, que atuam de forma integrada e articulada no território nacional, especialmente nas fronteiras do País.
A organização e padronização de procedimentos de trabalho das instituições militares são modelos de excelência que podem ser usados como referência para a organização e reestruturação dos órgãos policiais, bem como na padronização dos procedimentos policiais, visando uma atuação com maior segurança jurídica, respeito aos padrões internacionais de direitos humanos e efetiva cidadania.
O desafio do Ministério Extraordinário da Segurança Pública é condizente com as dimensões continentais do Brasil. Mas apesar de todas as adversidades, inclusive do prazo de gestão do atual governo, nunca houve condições mais propícias e cenário mais favorável para a promoção das necessárias reformas. O compromisso conjunto de todos os segmentos da sociedade pode tornar realidade a implantação de um modelo de segurança pública eficiente, eficaz e efetivo no Brasil.
*Magne Cristine Cabral da Silva é advogada, pós-graduada em Direito Público, especialista em Execução de Políticas de Segurança Pública. Graduada em Direito e Administração de Empresas. É escrivã da Polícia Federal aposentada. Diretora Executiva da Ordem dos Policiais do Brasil (OPB), Diretora Jurídica do Instituto Federal de Fiscalização (IFF) e Diretora de Comunicação da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef). Professora e tutora da Academia Nacional de Polícia Federal.
Fonte: Jornal Estado de São Paulo.
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