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- É hora de recrudescer, doutores! Postado em 04/10/2012 por SINPEFRN às 00:00

Esses EPAs já foram longe demais.

Desfilaram pelas ruas com um enorme elefante branco para criticar o inquérito policial e revelaram estatísticas que escancaram a nossa ineficiência.

Então, é hora de mentir sobre os números!

Carregaram o piano e mostraram que são peças fundamentais da estrutura da Polícia Federal. Conseguiram reduzir em quase 80% os trabalhos investigativos e operacionais do Departamento com esta famigerada greve, hoje histórica.

Então, é hora de mentir sobre o valor dos EPAs!

Começaram a discutir o modelo de segurança pública e levar esta discussão até intelectuais de renome e lideranças políticas da oposição.

Então, é hora de gritar: Chega!

É hora de esquecermos que passamos pela cadeira de direito constitucional e cercearmos o direito de greve indiscriminadamente. Passou da hora de enquadrá-los, com procedimentos disciplinares rigorosos, apenas para atormentar a vida desses pretensiosos e sonhadores policiais.

É hora de esquecermos que também fizemos nossas paralisações e atos públicos e tratar como se não os tivéssemos feito.

Sejamos hipócritas, doutores, que é um dom humano, hoje tão nosso.

Plantemos notícias falaciosas na imprensa, a fim de motivar a instauração de processos disciplinares ou quem sabe inquéritos policiais contra esses desordeiros e subversivos.

Se quisermos, podemos tentar colocar na rua alguns líderes desse movimento e sindicalistas: são corajosos demais para estar aqui conosco, não têm o perfil do policial pelego e cupincha. Esses grevistas possuem autocrítica, o que deve ser criminalizado em nosso meio.

Não importa se a greve é legal, se as reivindicações são legítimas ou se eles têm respeitado os limites impostos pelo Superior Tribunal de Justiça. Joguemos pesado! Joguemos sujo!

É hora de eliminarmos qualquer risco de mudança na estrutura ou ameaça as nossos devaneios de carreira jurídica. Vamos colocá-los em seu devido lugar, tratando-os como irresponsáveis e baderneiros.

É hora de usarmos toda a influência que angariamos às custas dos EPAs , ao longo das décadas, quando éramos muitas vezes os entrevistados da Polícia Federal, para impedir que consigam essa razoável (mas perigosa) reestruturação salarial.

Não podemos deixar que suas atribuições sejam reconhecidas, ainda que saibamos o que de fato fazem e são capazes.

Em 2012, devemos ser os baluartes da repressão. Nunca se esqueçam do nosso lema: hierarquia e disciplina!

- Mas e se os procedimentos disciplinares forem arquivados?

- Não importa. É hora de esquecermos que quem vai pagar a conta de nossa sanha irresponsável é a própria sociedade. Nunca nos responsabilizamos pelos procedimentos levianos, se esqueceram? Façamos da nossa corregedoria uma enorme fábrica de procedimentos de perseguição. Basta fechar os olhos e agir com o fígado, como já fizemos tantas vezes.

O que deve nos mover agora é o corporativismo. Vamos assumir e deixar sair do armário nosso medo da mudança. Sufocar o movimento internamente, sobretudo com ameaças. Intimidar e coagir os que se mostrarem mais frágeis, ainda que pareça covardia, será uma atitude bem vinda entre nós, pois perpetuará nosso poder de mando e manterá a subserviência.

O assédio moral é nosso poderoso aliado. É hora de ridicularizarmos as demandas dos EPAs, de ignorar argumentos tais como  experiência profissional, formação acadêmica e entusiasmo com o trabalho. Precisamos plantar que estamos ansiosos por encontrá-los pelos corredores, para reafirmarmos nosso pleno controle da máquina administrativa. Vamos usá-la em prol de nossos privilégios e nossa imagem de superioridade.

É hora de esquecermos, doutores, que eles conhecem muito a Polícia Federal, seus meandros, rotinas e seu passado recente. Esqueçamos que estes policiais são inteligentes e conhecem até nossos pontos fracos ou que podem passar a vigiar nossos passos.

É hora de recrudescermos, doutores. Deixar de lado a postura dos poucos de nós que se compadecem e fraquejam com a lembrança de rudimentos de direitos fundamentais. Esquecer e pisar.

Ignorar que esses EPAs fizeram acontecer todas as operações policiais de renome desta instituição, agir de forma que eles peçam para sair. Não precisamos de profissionais qualificados e motivados, mas de capachos que atendam nossos anseios onipotentes.  

- Precisamos de hierarquia e disciplina! - gritou um chefe insuflado.

- Mas hierarquia e disciplina é um discurso vazio e ultrapassado, resmungou um dos poucos inconformados.

- Não importa, doutor! Contenha-se. O senhor está falando a língua desses moleques ou eu estou enganado? Talvez o senhor não mereça estar ao nosso lado, nem convidado para nossas confraternizações ou vestir este terno.

Não importa que até o crime organizado tenha hierarquia e disciplina, ora bolas! Nem vem ao caso se hierarquia e disciplina devam ser orientadas para a finalidade ou interesse público, que no nosso caso é a eficiência da investigação criminal.

O que nos importa é continuar dando ordens. Se nossa vontade é que todos voltem ao trabalho e esqueçam esse absurdo direito de greve... nos devem obediência! Simples assim.

Estamos fortes, doutores. Não vêem os sinais de mesmice e fisiologismo que reina neste Estado? Vamos torcer para que as denúncias sobre os problemas de gestão, panfletadas por estes abnegados, tão óbvias e ululantes, parece que não tenham a repercussão que pretendiam.

Essa tal campanha de “Fora DG” apenas nos mostrou que estamos vivendo um momento em que a ineficiência, pusilanimidade e má gestão não são suficientes para derrubar ninguém. Vamos tripudiar. Aproveitemos o momento. Abafar essa greve e essa geração de policiais federais que se atreveram a pedir o reconhecimento que lhes é devido e a ousadia de discutir a segurança pública com tanta desenvoltura.

- Mas a Polícia Federal não pode ruir? São homens e mulheres capacitados e dedicados à instituição. Eles vão se sentir frustrados demais para trabalhar de novo.... E se com isso a Polícia Federal acabar? Perguntou, novamente, um pequeno grupo de desafinados com o coro.

- Sinceramente, não tive tempo para pensar nisso, doutores.

Querem um conselho? Não pensem nisso. Para nós, pouco importa. Nossa única meta é a manutenção do poder. A crise do modelo e a ineficiência da segurança pública não são problema nossos. 

Por fim, não se importem com o clima insuportável entre os servidores da PF. Depois que cumprirmos nossa nobre missão, voltaremos a ser os “Gente boa”, queridos e admirados por muitos. Em pouco tempo, novamente estaremos sorrindo falso.”

Nota: O texto acima foi enviado por um policial em greve, como sendo a transcrição de debates numa reunião, em data não definida. Como não foi possível confirmar sua veracidade, identificar os interlocutores ou a unidade da PF em que o suposto debate teria ocorrido, qualquer semelhança com personagens, condutas, fatos ou falas reais terá sido mera coincidência.

Fonte: Agência Fenapef

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